sexta-feira, 15 de maio de 2009

1982-Ascensão Portuguesa ao Cervino/Matterhorn - Parte 1


Corria o ano de 1982. Nos anos anteriores tínhamos batido com alguma frequência o maciço dos “Écrins”, dada a presença no parque do centro escola do CAF, em La Bérarde, e este ano não tinha sido excepção. Foi uma longa tirada de montanha nos Alpes, entre 29 de Julho e 25 de Agosto. No dia 1 comecei o curso de “Initiateur”, que durou 14 dias, com vários picos no parque d’Oisans, e apenas 1 cume de 4.000, a “Barre des Écrins”. O nosso Guia era o Paul Chassagne, que era para nós um ídolo e um verdadeiro mestre, com os seus 60 anos já feitos, com o seu mau feitio, a sua exigência desmedida, a sua pedalada inalcançável, mesmo para putos com 20 anos como nós. A “Acompagnatrice”, ou monitora auxiliar, Daniéle, também namorada do Paul, tinha a nossa idade e era maior que qualquer um de nós. Enorme.

A meio de Agosto, uma rápida passagem por “Chamonix”, onde nos reunimos todos com um encontro na casa dos Guias, e a 18 mudámos para Zinal:O grupo era constituído pelo Paulo Alves (o mais experiente de todos, com quem tinha feito a directa “Renaudie” no “Dent du Requin” no ano anterior), o Pedro Cid, meu companheiro de cordada e mentor de vida, o Jorge Matos, com menos experiência, mas sempre de bom humor, e eu próprio, Rogério Morais, já algo cansado após 3 semanas em montanha.

Logo no dia 19 iniciámos a subida para o refúgio “Grand Mountets”, ainda pelo caminho antigo da margem esquerda orográfica, difícil e algo perigoso, com algumas cascalheiras instáveis que levaram ao seu encerramento passado uns anos. Como de manhã foi preciso providenciar a logística de comida, gás e abastecimentos vários, a saída ocorreu já para o tardote. Eu fui ficando para trás com o Jorge Matos, e já não me lembrava que o caminho era muito, muito longo.Nesta versão antiga, tínhamos a obrigatoriedade de atravessar o glaciar por baixo do refúgio e subir toda a moreia, muito alta e escarpada. Como estava a ficar de noite e o glaciar se apresentava crevassado, apesar de muita pedra, achámos aconselhável calçar os crampons. É então que o Jorge Matos puxa da caixa de cartão dos crampons acabados de comprar na sua adorada “Villadomat” andorrenha, ainda com preço e tudo, e obviamente não regulados para a bota do bicho. Como devem imaginar, passei-me. Completamente… Penso que não cheguei a bater-lhe, mas pouco terá faltado. Resolvido o “pequeno” contratempo, com recurso a canivetes vários, Opinel, suíços, portugueses, lá conseguimos enfiar os crampons nas botas dele e prosseguimos caminho, praticamente de noite cerrada. Na outra margem, onde o Pedro e o Paulo já tinham chegado ao refúgio, víamos a luz acesa da entrada, de onde o guarda chegou até a lançar um “very light”, mas que para nós de pouca ajuda era: sabíamos onde estava o refúgio, onde estávamos nós, mas a grande questão era encontrar o caminho para subir a inclinada e escorregadia moreia arenosa, de saibro glaciar, escura como breu. Dentro ou fora do caminho, ainda hoje não sei, lá ultrapassámos este obstáculo, muito perigoso, e chegámos ao refúgio, onde entregámos a nossa comida para o guarda cozinhar, uma originalidade suíça, entretanto quase em desuso, devido à generalização da compra do jantar em altitude, qual restaurante com boas vistas. E que vistas tem o refúgio dos “Grands Mountets”! Para Sul, o Col Durand e a ponta de Zinal, ladeada pela Dent Blanche e pelo Obel GabelHorn. Para Oeste o Zinal Rothorn e o Trifhorn, mesmo ali à mão de semear, com enormes glaciares à volta.

No dia seguinte, o tempo estava completamente coberto e subimos até à “Arete du Blanc”, no Zinal Rothorn, com a secreta esperança de que o tempo viesse a melhorar e de que pudéssemos fazer este 4.000. Claro que se na alvorada estava mau, ao longo da manhã foi de mal a pior, e na afilada aresta de gelo mal dava para ver o companheiro de cordada. Meia volta, imediatamente antes da cota 4.000, e descanso para o refúgio. O dia seguinte ia ser longo.

Fim da Parte I:
Texto e fotografias 1,3 e 6: Rogério Morais
Fotografias restantes: Tiago Pais

1 comentário:

Alpine disse...

Boa jogada!
O artigo do Cervin está baril! Desconfio que a foto 2 foi tirada no vale do Zêzere, acima de Manteigas... 8 )
Quando colocarem fotos definam "big size" para aparecerem maiores. um abraço
Gonçalo

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Nego que a foto 2 seja do Vale do Zêzere. Firmemente. Nego ainda que a foto do cume do Cervino, a publicar, tenha sido tirada no cimo do Cântaro Magro de inverno, nem os óculos de alpinista eram de soldador. Isso são tudo difamações que serão desmontadas e punidas com a competente acção.
O Pedro Cid não está de ténis em cima da neve (são botins interiores de umas botas de altitude que se usavam na altura) nem eu estou de corta vento K-Way casca de batata. É um Haglofs série LMN minimalista, muito em voga na altura.
Rogério Morais